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Teatro em Goiás: vivo, muito vivo! - Jornal da Imprensa - Goiânia - GO

Por Carlos Brandão.

As artes cênicas em Goiás vivem seu melhor momento e vão se afirmando em quantidade e qualidade. Mas ainda ressentem a falta de uma crítica especializada na mídia local, que simplesmente ignora a explosão deste fenômeno cultural

Quando em 1988, a Secretaria de Cultura de Goiás bancou a montagem do espetáculo Martim Cererê, texto de Cassiano Ricardo, direção de Marcos Fayad e Hugo Rodas, o slogan da peça era "O Teatro vive em Goiás". Um grupo de atores, capitaneados pelo então jovem diretor Sandro di Lima, distribuiu um manifesto, deixando claro que "O teatro sempre viveu em Goiás". O manifesto lembrava que outros grupos existiam no Estado e fazia questão de lembrar a ação de pioneiros como Otávio Arantes, Cici Pinheiro e João Bênnio.

Após essa ligeira discussão sobre a existência do teatro em Goiás, muita água correu por baixo da ponte. O teatro feito naquela época em Goiás, carente, feito com poucos recursos e muito amadorismo, conheceu no ano 2000, dois cortes profundos e essenciais: o início das atividades da Escola de Artes Cênicas da UFG, e a criação da Lei Municipal de Incentivo à Cultura. A primeira trouxe no seu curso regular de quatro anos, a obrigatoriedade da leitura, da informação, do conhecimento na formação dos novos atores e diretores; a Lei de Incentivo de Goiânia trouxe os recursos que ajudaram a criar novos grupos e profissionalizar os já existentes.

A Lei deu o reforço financeiro para que as companhias teatrais pudessem realizar suas montagens, remunerando os profissionais envolvidos no trabalho. Com isso, uma nova geração de técnicos pode mostrar serviços. Técnicos de luz e som, cenógrafos, figurinistas, músicos, enfim, toda a equipe necessária para dar qualidade ao espetáculo. Atores, diretores e também o pessoal da produção, passaram a receber por seu trabalho. Esse reforço no caixa teve mais uma ajuda com a criação da Lei Goyazes, de incentivo à cultura, pela Agepel, e que teve seu primeiro projeto captado, em 2001. Some-se a isso os editais da Funarte, Petrobras, Banco do Brasil e outras instituições.

Hoje, boa parte das companhias de teatro locais pode circular com suas montagens por outros Estados, além de mostrar seus espetáculos pelo interior goiano e em temporadas nos diversos teatros de Goiânia. Esse é outro item importante que, coincidência ou não, teve seu boom após as Leis e a Escola de Artes Cênicas da UFG: a construção de novos e importantes teatros na cidade.

Casas de espetáculo

Goiânia que tinha dois teatros, Teatro Goiânia e Rio Vermelho, se viu, com várias casas à disposição do público e dos grupos. O Grupo Zabriskie criou seu teatro, que mantém com recursos próprios, há vários anos. Vieram os teatros Marista e da PUC. Depois, o Goiânia Ouro, Madre Esperança Garrido, Teatro de Bolso Cici Pinheiro, Teatro do Sesi, Inacabado, Galpão da UFG e Basileu Toledo França. Desses, o Teatro Goiânia está em reforma desde o início de 2010, e o Inacabado, que foi reinaugurado e não conseguiu ainda abrir suas portas, pela falta de alguns equipamentos.

Alguns grupos têm seus próprios espaços como é o caso da Cia. Carlos Moreira, que mantém um pequeno teatro no Centro de Goiânia, na Rua do Lazer.

Não citei o Martim Cererê, como um teatro formal, por um motivo óbvio: os dois teatros do espaço, Yguá e Pyguá, não devem ser chamados de teatro. Não existe queda, na platéia, o que faz com que todas as poltronas fiquem no mesmo nível. Isso atrapalha o público na hora de assistir o espetáculo. Quem senta da terceira fila para trás, não consegue ver o palco por inteiro. É preciso, sem purismos e sem polêmicas bobas, entender que Yguá e Pyguá são casas de shows, por excelência, e devem servir a um outro público, o de shows musicais que não necessitem tanto de poltronas. O rock e a música eletrônica, que já ocupam o Martim, há anos, são exemplos do modelo de ocupação que o espaço deve privilegiar.

Com incentivos financeiros à produção e casas de espetáculos de qualidade, vários novos grupos ocuparam espaços, nos últimos 11 anos. Às companhias já existentes como Teatro Exercício, Bandeirante, Martim Cererê, Zabriskie, Arte e Fogo, Cia. Carlos Moreira, Terra, Opinião, Espantalho, Transubstanciação, Casa do Teatro, Quilombo dos Palmares, 1.4, Pequi, Júlio Vilela e sua troupe, Rinocerante e Cia. Luiz Pinheiro, se uniram grupos como Nu Escuro, Ritual, Bastet, Oops, Cia in Cena, os dois grupos da PUC, Arte e Fatos e Guará, Bau Produções, Trupicão, Sertão, Novo Ato, Del Arte, Trip-Trapo, além de atores e atrizes que têm seus próprio grupos, caso de Renata Caetano, Newton Murce, Ivan Lima e Mauri de Castro, entre dezenas de outros bons grupos.

Apesar de não estarem no foco dessa reportagem, a dança e o circo também se beneficiaram com as mudanças no mercado. Na dança, a Quasar Cia. de Dança abriu caminhos mais sólidos. Vários bailarinos que passaram pelo grupo ocuparam lugar de destaque na cena. Companhias e bailarinos como Solo, Contemporâneo, Por Quá, Nômades, Behatriz Azevedo, Sacha Witkowski e Kleber Damaso, entre vários outros, mostram serviço e talento. Para dar um exemplo da qualidade da dança feita em Goiás, um dos melhores e mais premiados espetáculos dos últimos anos foi Dúplice, do bailarino Rodrigo Cruz e do ator Rodrigo Cunha. Goiânia tem diversas academias de dança, que sempre formam excelentes profissionais. Na área do circo, destaque para Lahetô, Sapequinha Troupe Show, Troupe Nikolay e Cia. Pés Nus.

Outra novidade na cena foi o surgimento de vários festivais de artes cênicas, em Goiânia. Em 1999, existia apenas o Festival de Teatro de Goiás, bancado pela Federação de Teatro, Feteg. Em menos de cinco anos, a entidade criou outros festivais como Cenas Curtas, Poesia Encenada, Monólogos, Comunitário, Estudantil. Alguns não acontecem mais. Mas todos eles ajudaram a dar uma injeção de ânimo nos grupos. Todos foram criados e aconteciam no Martim Cererê. A prefeitura de Goiânia criou o Festival Internacional de Artes Cênicas Goiânia em Cena, que existe até hoje, felizmente.

Grupos e pessoas físicas ligadas ao teatro ajudaram a criar novos festivais: Festival Nacional de Teatro, Festival de Bonecos e Galhofada, são exemplos de eventos que acontecem anualmente na cidade e que são esperados e privilegiados pela classe teatral e pelo público. O Festival do Corpo Ritual passou a se chamar Encontro de Atores e Criadores e tem trazido bons espetáculos a Goiânia. A própria Agepel criou o Tenpo, festival de teatro que acontece em Porangatu, a cada novembro.

Como se vê nessa amostragem, o teatro anda vivo e muito vivo em Goiás. Teatros não faltam e grupos muito menos. Espetáculos de boa qualidade estão em cartaz nas várias casas. Festivais que intercambiam ideias e montagens. Portanto, não há razão para o público não prestigiar. E não há razão muito menos, para a imprensa local desconhecer solenemente a produção teatral local. Nenhum órgão de imprensa tem um jornalista especializado em artes cênicas. Os jornais fazem suas matérias burocráticas, mas raramente se vê um jornalista cobrindo ou assistindo espetáculos.

Independente desse detalhe, repito, a produção teatral em Goiás está acesa, viva. Não interessa, nessa altura do campeonato, se o teatro vive ou sempre viveu em Goiás. Interessa saber que temos montagens de qualidade, casas de espetáculos para todos os públicos e platéia que acompanha sempre as montagens do grupos locais. Tá que, entre 30% e 50% da que está em cartaz, pode ser melhorado ou até mesmo deletado. Mas isso não é novidade e acontece em todas as áreas artísticas, pelo mundo todo. Mais: a qualidade de um produto é definido pelo público. Isso basta!

Teatros em Goiânia

Teatro Goiânia - Avenida Tocantins esquina com Avenida Anhanguera - Centro (em reforma)
Teatro Rio Vermelho - Centro de Convenções de Goiânia - Rua 4, Centro
Centro Municipal de Cultura Goiânia Ouro - Rua 3, esquina da Rua 9, Centro
Teatro Marista - Rua Hugo Brill, nº 109, Setor Marista (Colégio Marista)
Teatro da PUC - Avenida Fued José Sebba, nº 1184, Jardim Goiás
Teatro Zabriskie - Rua 148, n1º 248, Setor Marista
Teatro Madre Esperança Garrido - Avenida Contorno, n º 63, Centro - (Colégio Santo Agostinho)
Teatro Sesi - Avenida joão Leite, 1013, Setor Santa Genoveva, ao lado do Clube Antônio Ferreira Pacheco
Teatro Galpão da UFG - Praça Universitária - Setor Universitário
Teatro Escola Basileu Toledo França - Avenida Universitária,  nº 1175, Setor Universitário
Teatro de Bolso Cici Pinheiro - Avenida Anhanguera esquina com Rua R-1, Setor Oeste
Teatros Yguá, Pyguá e Ytakuá - Centro Cultural Martim Cererê - Rua 94, Setor Sul
Teatro Carlos Moreira - Rua do Lazer - Centro
Teatro Inacabado Otavinho Arantes - Avenida Anhanguera, nº 7030, esquina com Avenida P-2, Setor dos Funcionários (em reforma)


Em cartaz

Espetáculos que podem ser vistos atualmente nas várias salas  existentes em Goiânia.

Amor I Love You e Chiquinha, a fofoqueira - Grupo Zabriskie
Travessia III e I Believe - Teatro Ritual
Olho, Conta um conto que te encanto e Macário - Cia. Oops!
A história é uma istória, Bola de Berlim e Eu, Tu e Ele - Grupo Bastet
O Alienista, Envelopes, Carro Caído e O cabra que matou as cabras - Cia de Teatro Nu Escuro
A mais forte - Trama Teatro
O pedido de Casamento, Os três porquinhos, Shrek e Esses gregos das Arábias - Teatro Bandeirante
Puro Brasileiro e Voar - Cia. Martim Cererê
Fragmentos Quintanando e O Contador de histórias do Cerrado - Grupo Arte e Fogo
Édipo - Cia. Benedita de Teatro
Balanço - Grupo Independente de Teatro
Fanfarrões, a peça e De mala e cuia no trem do riso - Grupo ArttPalco
Dúplice - Rodrigo Cruz e Rodrigo Cunha
O boneco de cor - Cia de Teatro do Maleiro
Lendas indígenas e afro-brasileiras - Vagner Rosafa e André Campelo
Boi e Pluft, o fantasminha - Grupo Sertão
Cronicas de Motel, Diário de um Louco, O Príncipe Feliz - Cia. Novo Ato
Velório a Brasileira e Do arco da véia - Cia. Carlos Moreira
A Peleja da Menina que Caiu em Conversa de Passarinho - Grupo Passarinhos do Cerrado


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